terça-feira, 20 de outubro de 2009

Um pouco de Beto Leão, o jornalista

Pouco a pouco, Goiás vai conquistando o espaço que lhe cabe no cenário cinematográfico nacional. Sem muita tradição na arte de fazer filmes, os goianos têm aperfeiçoado a cada dia as suas técnicas, idéias e narrativas audiovisuais, o que tem permitido uma maior visibilidade das produções goianas nos festivais nacionais e internacionais.

Em 1999, ano em que o FICA estreou no calendário dos grandes festivais internacionais, o cineasta João Batista de Andrade prefaciou meu livro Bennio - Da Cozinha para a Sala Escura, em que demonstrava seu “espanto com a absoluta ausência de um cinema goiano”. De acordo com o pensamento na época do então coordenador geral do Festival Internacional de Cinema e Video Ambiental, “nos últimos anos, lutando contra todas as regras e, mesmo, contra a má vontade dos que pensam controlar a cultura brasileira, o cinema brasileiro saiu do eixo Rio-São Paulo e mostrou que criatividade existe onde for possível exercitá-la. Nesses anos tenho visto, tanto no mercado quanto nos festivais nacionais e internacionais (com sucesso), filmes de Pernambuco, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Minas, Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo e tantos outros estados, onde, aliás, houve a preocupação de se criarem apoios locais. E nada de Goiás.”

Já naquele primeiro ano do FICA, em que participaram apenas cinco produções goianas, um convênio entre a Agepel (na época Fundação Cultural Pedro Ludovico) e a ABD-GO possibilitou a finalização de três curtas-metragens, em 16mm e 35mm - Santo Antônio dos Olhos d’Água, de Kim-Ir-Sen, Bubula, o Cara Vermelha, de Luiz Eduardo Jorge, e O Pescador de Cinema, de Angelo Lima -, dois dos quais participaram da mostra competitiva, sendo que um deles (Bubula, o Cara Vermelha), fez carreira nacional e internacional, ganhando diversos prêmios. Os dois últimos mais A Lenda da Árvore Sagrada, de Eládio Garcia Telles, prêmio de melhor produção goiana no 1º Fica, foram selecionados no 10º Festival Internacional de Curtas de São Paulo, e na Jornada Internacional de Cinema da Bahia.

Finalmente, o Brasil estava começando a conhecer um pouco do cinema goiano, já que a última aparição em festivais nacionais havia acontecido em 1978, quando José Petrillo saiu com o troféu Candango de melhor curta-metragem em 35mm com seu Cavalhadas de Pirenópolis. Passados esses oito anos desde a primeira edição do FICA, a realidade é bem outra para o audiovisual goiano. No próximo mês de julho, a IV MoVa Caparaó - Mostra de Vídeo Ambiental do Caparaó, festival capixaba que dedica todos os anos uma janela aos filmes premiados no FICA, apresenta em sua mostra competitiva nacional seis produções de Goiás, das treze produções selecionadas. São eles: Coque do Buriti, de Gel Messias; Flower Power, de Sérgio Valério, Lamento, de Kim-Ir-Sen Pires Leal; É da Raiz, de Ângelo Lima, e Minha Árvore, de Andréia Miklos Mocó.

Em maio último, o 4º Festival de Cinema de Maringá apresentou em sua mostra competitiva seis produções goianas: 14 Bis, de Guilherme Gardinni; A Resistência do Vinil, de Eduardo Castro; Coque do Buriti, de Gel Messias; É da Raiz, de Angelo Lima, Goiânia - Sinfonia da Metropóle, de Rodolfo Carvalhaes; O Filme que Nunca Existiu, de Sérgio Valério. Rapsódia do Absurdo, de Cláudia Nunes, participou do Cine PE 2007, em abril, e do 14º Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá, em maio.
As mostras e festivais, independentemente de se ganhar prêmios ou não, são muito importantes para qualquer cinematografia porque permite o contato do público com diferentes estéticas e linguagens. Na medida em que o cinema goiano está inserido nesse contexto, ele só tem a crescer, uma vez que recebe críticas de outros profissionais do meio e os realizadores podem comparar o que estão fazendo, tanto em termos de estruturação de roteiros quanto na própria estrutura narrativa, com outros filmes/vídeos do resto do país.

Com o advento do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, o Estado deu o pontapé inicial para tornar-se um pólo de exibição e de produção do cinema goiano. Em suas nove edições, o FICA vem estimulando os cineastas goianos a produzirem mais e melhor a cada ano, ainda que as produções locais, em sua maioria, careçam ainda de aperfeiçoamento técnico e artístico, principalmente no gênero ficção, mas também no documentário. O FICA tem demonstrado que o cinema perdeu a ingenuidade diante do grau de perigo que as agressões descontroladas do homem têm causado ao meio ambiente, principalmente no século passado, cujas conseqüências estamos vendo refletidas no atual milênio. Uma prova disso é que o tema das mudanças climáticas é o mote dominante na atual edição do festival, tanto nos filmes quanto no Fórum sobre o Clima, que trará a lume os impactos na biodiversidade e no meio ambiente do continente sul-americano, com particular ênfase no território brasileiro.

Nesse contexto, para que as produções goianas possam competir em pé de igualdade com os filmes ambientais nacionais e estrangeiros é necessário que os realizadores tenham pleno domínio das técnicas narrativas cinematográficas de uma maneira geral. A fim de fazerem filmes ambientais competitivos, os realizadores goianos têm de exercitar também a feitura de filmes ficcionais que dialoguem de forma intelegível com o público.

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(*) Beto Leão é jornalista, pesquisador de cinema e documentarista. Atual presidente da ABD-GO, escreveu os livros Bennio – Da Cozinha para a Sala Escura, O Cinema Ambiental no Brasil, Cinema de A a Z – Dicionário do Audiovisual em Goiás, Goiás no Século do Cinema (em parceria com Eduardo Benfica) e é um dos autores da Enciclopédia do Cinema Brasileiro.